“…a felicidade está no CAMINHO, não no destino.”
Este aqui foi meu primeiro Projeto de Aventura. Mas serviu muito bem para me motivar a fazer outros e também conhecer pessoas que fizeram algo parecido.
* Nota do autor de 2016.
Mapa dos trechos:
- Trecho 1 – Rio de Janeiro/RJ – Petrópolis /RJ
- Trecho 2 – Petrópolis/RJ – Itaipava/RJ
- Trecho 3 – Itaipava/RJ – Inconfidência/RJ
- Trecho 4 – Inconfidência/RJ – Paraíba Sul/RJ
- Trecho 5 – Paraíba Sul/RJ – Paraibuna/RJ
- Trecho 6 – Paraibuna/RJ – Juiz de Fora/MG
Início: 06 de setembro de 2002
Fim: 12 de setembro de 2002
Preparativos para a caminhada
Era julho de 2001, meu amigo Bruno Carazza me manda um e-mail falando de uma pessoa que tinha feito um site na Internet sobre uma caminhada. Logo fui acessando, me impressionei pelos depoimentos e pela aventura em si. Combinamos de realizar a caminhada em outubro, no feriado do dia 12, mas os contratempos impediram que realizássemos aquela empreitada.
Um ano depois, estava me organizando na empresa para tirar as primeiras férias em 7 anos de estudo, estágio e muito trabalho.
A idéia da Estrada Real veio como a única e melhor alternativa. Primeiro pelo desafio e segundo porque era um projeto a ser iniciado e concluído. Tratei tudo como um grande projeto, custos, prazos, riscos, qualidade, um engrenamento perfeito de desafios.
Muita gente começou a me questionar: é promessa? você está bem? isto só pode ser depressão! o que você vai ganhar com isto? Em compensação existiram aqueles que me disseram: vá em frente, aproveite, você irá crescer muito com isto. É claro que dei ouvidos ao segundo grupo de pessoas.
Fui até o Shopping, comprei o Guia, comecei a estudar os depoimentos, descobri aí meu primeiro ponto fraco: estrutura física. Tudo bem que não sou nenhum atleta, mas também não levava uma vida tão sedentária. Em agosto iniciei minhas caminhadas. Todos os dias, indiferente das condições do clima, fui para a Praça da Liberdade, ficava lá caminhando entre 1,5 e 2 horas. Muito alongamento também ajudou nesta fase preparatória.
Em paralelo estudava o caminho, custos, paradas no final do dia em hotéis e pousadas, previsão do tempo (que por sinal sempre marcava nublado ou chuvoso). Cada ligação que fazia para os lugares de parada me empolgava mais ainda para iniciar a aventura.
Não achei um Filho de Deus para ir comigo, todo mundo tinha seus compromissos. Mas eu estava decidido, iria a todo custo.
Material a levar, cuidados e afins:
Levei um boné para me proteger contra o sol, um cantil para matar a sede, um cajado para espantar alguns cachorros no caminho, lanterna, micropore e Rifocina (obrigado Virgínia pela dica), roupas leves. A bússola utilizei-a uma vez apenas, mas foi de grande valia, dentro do porta-guia carregava um bloquinho de anotações e uma caneta. A mochila foi especial, própria para este tipo de trajeto, 60 litros, onde coloquei o mínimo necessário.
Para evitar bolhas nos pés segui orientação do Raphael Olivé, duas meias, uma bota não muito apertada e cada duas horas uma parada para secar os pés do suor e o interior da bota.
Dinheiro eu levava o necessário também, muitos lugares aceitam cheques ou cartão de crédito. Durante o trecho urbano (RJ, Petrópolis, Itaipava, Paraíba e Juiz de Fora) existem postos bancários para saque.
Alimentava muito bem no café da manhã, no almoço era barrinha de cereal, sanduíche de pão com presunto e queijo, mas o jantar eu caprichava, era bem completo de carbohidratos, aquirindo aí energia para o dia seguinte.
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Trecho 1 – Rio de Janeiro/RJ a Petrópolis/RJ (dia 7 de setembro de 2002)
Saí de Belo Horizonte no dia 6, às 23:59hs. Fui de ônibus até a rodoviária do RJ. Cheguei na capital carioca às 6:30hs, muita chuva, um black-out total na cidade, parecia que tinha passado um furacão por ali.
Perguntei a todos onde pegava um ônibus para Imabariê, iria começar a caminhada no km 4,9 descrito no guia. Depois que tive a informação de mais de 3 pessoas (isto é importante para se validar o próximo passo), decidi pegar um coletivo indo para Piabetá e que passava por Imabariê. Literalmente estava na chuva e para me molhar mais ainda, peguei uma “perua”, a aventura começava.
Expliquei ao motorista onde queria descer, chegamos a um consenso que era na intersecção da linha de trem com o canal Imbariê. Isto ficava a 1,5 km da passarela que precisava encontrar. Achei-a exatamente no km 135 da Rio-Magé. A chuva continuava e cada vez mais forte.
Fui até a passarela, fiquei em dúvida quanto a localização do caminho, usei a bússola para encontrar o Norte, foi super fácil. Parei em um barzinho para tomar um café, as pessoas ali me deram maiores dicas, o trecho adiante era perigoso, boca de fumo e muita malandragem. Confesso que fiquei com medo, mas segui em frente. Eram 8:30 hs daquele dia 7 de setembro, muita chuva e névoa.
Em Parada de Angélica comprei um cabo de enxada que seria usado como meu cajado, para defesa pessoal, contra cachorros. Cheguei em Raiz da Serra às 10:30hs. As meias estavam muito molhadas. fiquei ali secando-as e descansando. Descobri que existe um trem na Central que vai até aquele lugar, sugiro quem for fazer o trecho do primeito dia, que comece ali em Raiz da Serra, tem muitos ônibus também.
Esperei a chuva parar e a estrada secar, subir a Serra do Mar para Petrópolis com o caminho molhado é muito perigoso. Cheguei no Meio da Serra às 12:35hs. Costas doendo, o sol apareceu pela primeira vez. Umas pessoas participavam de uma corrida vindas de Lopes Trovão. Percebi que no Rio todo mundo conversa como o Romário, amigo é “parceiro”.
Sempre que iniciava um novo trecho perguntava se estava no caminho certo e se havia bandidagem a frente, precisava me certificar disto para minha segurança.
Cheguei na pousa da Rua Tereza as 16:30hs, com chuva. O corpo todo moído, quando estava no Alto da Serra e vi lá embaixo todo o trecho que tinha percorrido foi uma sensação que dinheiro nenhum do mundo conseguiria pagar. Na pousada pedi um macarrão delivery e lembrei-me de uma coisa, só quando cheguei em Alto da Serra é que vi o primeiro Posto Policial.
Liguei a TV, o jornal mostrava que no Rio havia passado um furacão com ventos de mais de 120 km/h.
Trecho 2 – Petrópolis/RJ a Itaipava/RJ (dia 8 de setembro de 2002)
“nenhum sonho é impossível, mas é preciso trabalhar para realizá-lo”. Foi com esta frase, que assisti no programa da Globo, PEGN, às 7:30hs da manhã daquele domingo que iniciei o segundo dia.
Fiz um breakfast caprichado, muita fruta, chocolate quente, pão com presunto. Preparei meu almoço. Conversei com o Marcos, dono da Pousada, que estava muito feliz por receber os caminhantes da Estrada Real. A cozinheira me perguntou o que me levava a fazer aquilo, respondi que estava de férias e queria fazer algo diferente.
Saí dali às 9:30hs, desci a Rua Tereza até o Rio Palatinado, quase me perdi, mas quem tem boca vai até Juiz de Fora. Passei por um túnel muito cabuloso, para não dizer PERIGOSO. As pessoas na rua ficavam me olhando, era engraçado.
Cheguei em Correias às 12:20hs, um lugar que parecia com minha Bom Despacho. Comprei umas laranjas, parei para fazer o ritual das meias e da bota, os joelhos doíam muito. A pracinha era aconchegante, Posto Policial, pessoas jogando dama, transeuntes levando seus cachorros para passear, todo carioca tem no mínimo dois cachorros, isto apresentava um perigo eminente.
Saí dali as 13:10hs. Eram 14:10hs quando cheguei no Rancho Bem-te-vi. Pouquinho antes tem o “Lagos de Itaipava”, um lugar legal para levar a namorada. Comi um cereal, bebi água. Logo em seguida atolei meu pé numa água parada, o gerenciamento de riscos entrou em ação, troquei a meia, sequei o pé e fui adiante.
Chegando no centro de Itaipava, já eram 15:40hs, encontrei-me com um senhor que vendia umas bolsas muito bonitinhas que a filha fazia para pagar a faculdade. Neste nosso país tem muita gente batalhadora, disse a ele que poderia se orgulhar muito pela que filha que tinha, ele me contou que até o pessoal da Malhação já comprou da bolsa.
Logo depois de um bom papo toquei adiante, chegando na BR 040 precisava localizar o km 54, deparei-me com o km 58, pensei: para baixo deve ser o km 57 e por aí, mas errei. Quando você está cansado, afim de chegar e comete uma falha destas, ainda bem que encontrei com um senhor que veio conversando comigo durante no mínimo os próximos dois quilômetros.
Estava anoitecendo, peguei minha lanterna amarrei-a na ponta de cima do cajado, coloquei uma lente vermelha e andei na contra-mão dos carros que tiravam fininha em mim.
17:45hs, finalmente o Spa, finalmente uma sopa de macarrão altamente campeã. Fui recebida pela Sônia e pela Nancy, e também pela hóspede Moná, uma ótima companhia para aquele domingo exaustivo.
Trecho 3 – Itaipava/RJ a Inconfidência/RJ (dia 9 de setembro de 2002)
Neste dia tinha combinado de tomar café com Moná, acordei e ela já estava lá. Nos despedimos, trocamos e-mails. O café da manhã foi maravilhoso, apenas uma coisa me preocupava, as pernas ainda doiam.
Saí do Spa eram 9:30hs. Fui esforçando ao máximo para chegar ao entroncamento com a RJ 123. Tinha muita subida, mas do alto avistei lugares lindos.
Chegando neste ponto, avistei muitos eculiptos, sítios bem cuidados. Fiz um lanche e peguei a estrada em direção a Secretário. Um trecho muito perigoso, os carros passavam bem próximo a mim.
Eram 13:45hs quando parei em Secretário, fiz um lanche em uma padaria. Percebi que os joelhos estavam por um triz, peguei um coletivo até Fagundes, de lá fui a pé, quase chegando em Sebolla (ou Inconfidência) um caminhoneiro me deu uma carona. Meus joelhos agradeceram.
Fui recebido pelo André, que estava jogando bola numa quadra que tem no centro do povoado. Conheci o Museu de Tiradentes, restos mortais dele, a Igreja de Santana. No lugar todos sabiam da história da Inconfidência Mineira.
Encontrei-me com D. Jurandir, ou melhor D. Didi, é assim que ela gosta de ser chamada. À noite estávamos todos à mesa, Didi, Virgínia, Rita, André e sua irmãzinha, Rute, Tio Heitor. A simplicidade de todos me surpreendeu.
Lavei minha camisa e minhas meias, fui dormir, estava chovendo.
Trecho 4 – Inconfidência/RJ a Paraíba do Sul/RJ (dia 10 de setembro de 2002)
Fui tomar café com a família de Inconfidência. Tiramos fotos, nos despedimos, saí de Sebollas eram 9:50hs.
A passos lentos mas constantes, comecei a sentir meu tornozelo esquerdo. Tive a impressão que os preparativos não tinham sido suficientes.
No caminho encontrei-me com Rita que já voltava do trabalho em Paraíba. Depois, quase chegando em Queima-Sangue encontrei-me com o André no ônibus escolar.
Parei para descansar, o cajado além de espantar os cachorros é muito bom para apoiar os pés, para evitar de pisar diretamente no chão frio e sujo.
O cajado estava sendo usado para apoiar o corpo, mas logo cheguei em Queima-Sangue, lanchei, descansei. O trecho adiante no guia é mostrado como sem pavimentação, mas há um ano e meio eles tinham asfaltado, resolvi pegar um ônibus, além do perigo dos carros estavam também muito cansado. Saí de lá eram 14:00hs.
Chegando em Paraíba decidi procurar um hotel fazenda fora da cidade, adiantava meu próximo trecho e além do mais os hotéis dentro da cidade eram muito ruins e caros.
Encontrei a Pousada e Restaurante Sarandi, logo após o Hotel Fazenda Santa Helena. Fui recebido pela Marta e pelo Toninho. É importante avisá-los com antecedência, mas mesmo assim a recepção foi muito boa. Eram 16:30hs.
Trecho 5 – Paraíba do Sul/RJ a Paraibuna/MG (dia 11 de setembro de 2002)
8 da manhã. Preparei-me, como tinha feito todos os dias, micropore nos lugares onde a bota estava machucando meu pé, vick-vaporub nos pés e duas meias. Fui tomar café, fiquei conversando com o Toninho, ele era Economista e sua esposa Veterinária. Cuidavam os dois há 14 anos da fazenda, que era um verdadeiro agro-business, ele me contou que tinham se formado em Viçosa. O papo foi muito bom, mas era preciso continuar.
Tomei um Apracur para aliviar as dores, sabia que não era aconselhável, mas estava sendo preciso. O tornozelo esquerdo amanheceu inchado.
Saí de lá eram 9:45hs, o trecho a seguir prometia, mas era o mais deserto em se tratando de recursos e pessoas. Os terríveis cachorros apareciam do nada, felizmente não gostavam de roer osso.
Um detalhe, como não tinha levado relógio, o sol era meu ponto de referência para os horários, descobria onde era o Norte, via a altura do sol e pronto, ali estava meio relógio. Felizmente naquele dia estava bem ensolarado.
Passei por um lugar chamado Palestina
Paisagens lindas, só vendo para entender.
Encontrei-me com um pescador que voltava do Rio Paraibuna, me disse que estava perto.
Às 14:30hs avistei a pedra do Paraibuna, segundo meu amigo Ronaldo Faria, foi ali que em 1964 as tropas de MG e RJ se encontraram depois do Golpe Militar, os mineiros a favor da Ditadura Militar e os cariocas a favor do Governo. Quem primeiro chegasse na pedra (que deve ter uns 200 metros de altura), conseguiria render o outro pelotão. Os mineiros conseguiram chegar primeiro que os cariocas.
Meu ponto final foi Mont Serrat, uma vilazinha do lado do RJ, do outro lado, bastava atravessar a ponte, era MG e se chamava Paraibuna, um povoado que pertence a Simão Pereira.
Fui repousar no Hotel Fazenda Santa Helena, um espetáculo de lugar, com direito a um jantar maravilhoso.
Trecho 6 – Paraibuna/MG a Juiz de Fora/MG (dia 12 de setembro de 2002)
O Hotel Fazenda Santa Helena é muito bom, descobri que é possível fazer rapel, rafting, um programa e tanto para ir junto com a turma de amigos.
Tomei meu café, eram 9 da manhã, meu tornozelo continuava inchado. Fui em Mont Serrat no RJ para conhecer o Museu Ferroviário mantido pelo DNER, muito interessante, cheio de placas de rodovias do Brasil inteiro.
Fui até o posto policial, através de uma indicação do pessoal do Hotal Fazenda o policial me arrumou uma carona até Juiz de Fora.
Minha sorte é que foi em um caminhão carregado de areia, assim pude conhecer os lugares indicados no guia.
Como não tinha nenhum recorde para bater e o objetivo era ir até o meu limite, decidi fazer o resto da viagem outro dia.
A carona me deixou na BR 040, peguei um coletivo até o centro de Juiz de Fora, eram 13hs.
Chegando na rodoviária comprei uma passagem para BH, iria chegar em casa por volta de 20 hs.
Comentários Finais
É muito bom chegar a um objetivo.
Quando voltei a BH no dia 12, já era noite, o trânsito rápido da cidade grande, o barulho, a multidão de transeuntes, depois de alguns dias de reflexão e muita introspecção me fez questionar se era aquilo mesmo que eu queria para minha vida. A resposta não veio rápida, mas felizmente veio, para os objetivos que tenho agora é isto que quero e serão de grande importância aventuras como esta que vivi na Estrada Real no trecho entre a cidade do Rio de Janeiro e Juiz de Fora.
Será uma lembrança para a prosperidade.
“Saber desfrutar com plena consciência os espaços cômodos que conseguimos conquistar na vida, é compreender que o excesso de comodismo é tão pernicioso quanto o próprio abandono.” (do livro EXEGESE LOGOSÓFICA – Pecotche)
Muito legal!! Fiquei com vontade de fazer!!
Parabéns. Uma bela jornada, com a superação de vários obstáculos.
obrigado!