Somente pensamos na importância da vida em momentos difíceis. A perda de alguém muito querido, o desemprego , a impotência diante de uma doença. Fatos assim nos fazem refletir. Alguns reclamam, outros aproveitam para levantar a cabeça e seguir adiante. São escolhas, e elas nos preparam para o dia a dia da vida.
Experiência é algo difícil de comprar por aí. É impossível chegar no mercado e pedir “Ei, por favor, me arrume 10 meses de experiência”. A Carina vivenciou na sua travessia, desde o planejamento, durante e o após, situações que ficarão marcadas em sua mente para o resto de sua vida.
Este artigo é o terceiro (e último) de uma série de 3 onde vou contar a Preparação, Durante e Depois de toda essa magia que é fazer um Projeto de Aventura.
1) Quando desembarcou no Brasil, qual foi a sensação?
Primeiro me senti um peixe fora d’Água. Eu não sei dizer se era por causa da minha aparência. Ou se era por eu ter ficado tanto tempo imersa em um estilo de vida tão diferente daquelas pessoas que iam e vinham e do qual eu também fazia parte. Parecia que tudo estava diferente, mas aos poucos percebi que o meu modo de ver as coisas é que havia mudado. Então eu senti a mesma mistura de sentimentos de medo e alegria que senti no dia que dei meus primeiros passos da minha caminhada. Havia chegado a hora de dar os primeiros passos novamente mas dessa vez na caminhada da minha vida.
2) E agora, como será sua vida?
Eu ainda não consigo te dizer como será e talvez eu nunca consiga. Ainda estou colhendo os frutos dessa experiência e só o dia a dia vai me dizer o que mudou. Tenho me surpreendido muito com minhas reações mediante a situações que antes eu encararia de uma forma muito diferente. Percebo que estou mais segura, menos apegada a coisas pequenas e estou mais engajada em ações solidárias.
3) Tenho certeza que você teve muitos aprendizados. Mas se tivesse que selecionar os 3 principais, quais seriam?
Tirei aprendizado do meu cajado, mochila e bolhas.
O Cajado: imprescindível para uma caminhada segura pois serve de apoio. Ele distribui o peso do nosso corpo e nos dá equilíbrio e segurança nos momentos em que podemos escorregar. Descobri que meu cajado é minha família com isso estou mais próxima dela.
A mochila: a maior dúvida do Peregrino é sobre o que levar na sua mochila. “A mochila tem o peso dos seus medos” e não é diferente do peso que carregamos nas nossas costas no dia a dia. É preciso descarregar nossas “mochilas da vida”, desapegar de sentimentos e coisas inúteis que só servem para pesar dificultar nossa caminhada pela vida.
As bolhas: a caminhada não seria a mesma sem as dores das bolhas nos pés. Eu tinha que drená-las todos os dias para garantir uma caminhada mais confortável e tive que aprender a conviver com elas afinal eram inevitáveis e assim tem que ser com “bolhas” da vida também. Temos que aprender superar, tratar e a conviver com nossas dores para seguir adiante pois elas também são inevitáveis.
4) Do ponto de vista de planejamento da viagem, o que você aprendeu na prática que serviria para uma nova caminhada de Santiago ou outras aventuras?
Quando decidi fazer a viagem eu tinha apenas dez meses para me planejar financeiramente e fisicamente. Fiz uma planilha muito detalhada com todos os gastos que eu teria até eu voltar. Inclue também os gastos fixos que eu teria mesmo sem trabalhar. Peguei esse montante e dividi por dez. Cheguei a conclusão que para realizar meu sonho em apenas dez meses eu teria que abrir mão de muitos “luxos”. Diminui minhas saídas dispensei a faxineira e praticamente não comprei roupas, sapatos entre outras coisas neste período e consegui! A partir desse planejamento qualquer pessoa pode realizar seu sonho de viajar para qualquer lugar do mundo, é só uma questão de foco!
5) O que você tem feito para continuar a lembrar dos aprendizados da caminhada e como está fazendo para disseminar o conhecimento adquirido?
Fiz um diário enquanto eu estava lá e sempre que me bate a saudade eu recorro a ele, a livros e videos da Internet. Continuo tendo contato com meus amigos Peregrinos e agora os novos recorrem a mim para tirar suas dúvidas. É um ciclo vicioso do bem, hoje você ajuda e amanhã é ajudado. É uma troca sem fim. “Uma vez no Caminho sempre no Caminho”!
6) Se você tivesse que dizer para alguém fazer o Caminho de Santiago, o que diria?
Ninguém diz “vou ali tirar férias no Caminho de Santiago de Compostela”. Quando alguém decide fazer é por que já sabe do que se trata e sabe o que procura. É uma decisão que vem de dentro do coração, é um chamado que a pessoa recebe. Se alguém disser que pretende fazer eu diria para essa pessoa: “Se prepare para a maior experiência espiritual da sua vida e conte comigo no que você precisar antes, durante e depois da sua viagem!”
7) Logo que voltou você teve um acidente, como isso ocorreu? O que você conseguiu colocar em prática com os aprendizados da Caminhada?
Fui atropelada atravessando na faixa de pedestre em BH. Quebrei a perna e isso está me rendendo três meses de cama mais um período de reabilitação para reaprender a andar. Quem diria que isso fosse acontecer comigo logo depois de andar 800km, não é mesmo? Eu tenho duas escolhas, ou eu encaro essa minha situação com uma mochila bem pesada cheia de sentimentos negativos nas costas ou eu opto por descarregá-la desses sentimentos que só servirão para dificultar minha reabilitação e encaro isso tudo com mais sabedoria. Eu preferirei contar essa história com muito aprendizado e leveza. É certo que se eu não tivesse passando pela experiência da Peregrinação eu estaria passando por esse período de uma forma bem mais sofrida.
8) Qual a próxima aventura ?
Assim que eu estiver reabilitada pretendo fazer um mochilão como voluntária em alguma ação solidária em países pobres da América do Sul, África ou Ásia. Ainda é um sonho mas os projetos nascem através dos sonhos não é mesmo? Então vamos sonhar!
- Veja Parte 1 da Caminhada
- Veja Parte 2 da Caminhada
- Veja Parte 3 da Caminhada